Pão de Cada Dia
Gabriel o Pensador
Presente no(s) disco(s) Ainda é Só o Começo (1995).
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Letra da música Pão de Cada Dia
[Verso 1]
Mais um dia de trabalho, querido diário
Eu ralo feito otário e ganho menos do que eu valho
Mas necessito de salário, que é bem menos que o necessário
Hoje os rodoviários tão em greve por melhores honorários e eu procuro um que me leve
Eu tenho horário
Não posso chegar atrasado não posso ser descontado
Se eu falar que foi greve meu chefe pode ficar desconfiado
E se o desgraçado quiser me dar um pé na bunda eu vou pro olho da rua e rapidinho ele arruma outro pobre coitado
Desempregado desesperado é que mais tem
(Olha o ônibus!!)
Hein?
Já vem lotado gente pra cacete vidro quebrado (Foi piquete)
Motorista com um porrete do lado
Ele furou a greve porque também teme ficar desempregado
Deixar seu filho desamparado
Quem sabe ser despejado do barraco
(E o aluguel lá no morro também já ta puxado
Eu nem sei se eu tô sendo otário ou esperto
Eu tô aqui mas também tô torcendo pra greve dar certo)
Eu fico calado porque eu também tô preocupado
O meu salário até o fim do mês já ta contado e o meu moleque tá todo gripado
Se eu tiver um imprevisto eu vou ter que comprar remédio
Num sei como é que eu faço
Eu num sô médico
Se precisar eu vou ter que pedir um vale na batalha
Como um esfomeado pede uma migalha
E o canalha lá pode até negar e aí vai ser pior
Porque o meu único ganha-pão é esse meu suor
[Refrão]
Preciso do pão de cada dia e num sô filho do padeiro
Então preciso do dinheiro
[Verso 2]
Eu tô no meu carro
Me olho no espelho…
Eu acho hilário
Eles acham que eu num trabalho só porque eu sou um “empresário”
Meus funcionários devem achar que eu sou um porco mercenário
Mas eu num sô nenhum milionário
Pra ser mais claro eu tô num mato sem cachorro
Se eu corro o bicho pega
Se eu fico o bicho come
Pra quem vou pedir socorro?
Chapolim? Super-homem?
As despesas me consomem
Os lucros são poucos e ainda tenho que pagar meus homens e zelar pelo meu nome
Que sufoco! O governo num ajuda
Empréstimo de banco nem pensar!
Sem contar a faculdade dos filhos pra pagar
Eles pensam que eu sou marajá!! (Num dá?)
Não vai dar “Insensível você diz”, mas é impossível eu te aumentar “impossível te fazer feliz”
Eu nunca quis ver meus empregados cansados com fome
Mas o aumento tá negado
Agora some que eu tô ocupado no telefone
Eu não sou Raul Pellegrini
Essas coisas me deprimem e tal
“Mas é que eu tenho que manter a minha fama de mau”
Durão, afinal, eu sou o patrão
Não posso ser sentimental
Porque eu não tenho dinheiro de sobra
Talvez tenha que demitir mão de obra com urgência
Eu não consigo dormir
Não consigo superar a concorrência
Não sei se eu vou infartar ou se eu vou à falência
[Refrão]
Preciso do pão de cada dia e num sô filho do padeiro
Então preciso do dinheiro
[Verso 3]
(Melhor do que dar um peixe a um homem é ensiná-lo a pescar)
Então em ensina onde eu pesco grana porque peixe só tem se comprar
Tem que pagar pra comer
Tem que pagar pra dormir
Tem que pagar pra beber pra esquecer
E até pra morrer tem que ter pois vão te pedir (dinheiro)
Pro enterro (dinheiro)
Pro caixão (dinheiro)
Pro velório (dinheiro)
Pro sermão
Também é caro parir
Pagaram pr’eu entrar e eu rezo pra num sair daqui
E eu tenho que me cuidar porque o dinheiro mesmo pode interferir no nosso destino
Fazer o sino tocar
Influenciar qualquer menino a nos matar
Você não sabe o que é capaz de fazer por dinheiro
Alguém que não tem nada a perder e vê a TV do mundo inteiro
Mostrar tudo o que há pra se ganhar pra quem está no fundo do poço
O único caminho é pro alto nem que seja por cima do seu cadáver, moço
Eu vejo isso o tempo inteiro
Eu sou coveiro (sério?)
Sem mistério
No cemitério é onde eu cavo o meu pouco dinheiro
Eu sou importante Deus ta de prova
A todo instante ele me manda gente e eu sempre abrindo as covas
Até hoje eu não sei se ele me perdoou do dia em que eu mexi naquele defunto cheio de dente de ouro
Dei uma de dentista e deixei o rosto do corpo todo torto
Mas é que eu ganho muito pouco
Aliás eu num tenho nem onde cair morto
[Refrão]
Preciso do pão de cada dia e num sô filho do padeiro
Então preciso do dinheiro
[Verso 4]
Eu sou PM
Não pense que é fácil
Tem que ser malandro pra viver se arriscando rondando pra cima e pra baixo
Na corda bamba
Posso tombar na próxima curva
E minha mullher em casa estraga as unhas com medo de ser viúva
E os meus nervos também não são de aço
Meu caráter muito menos por isso eu sempre faço
Meus cambalachos com o tráfico
Eu já tô mancomunado
Quando eu não tô dormindo ou tô trincando ou extorquindo os viciados
Eu fico rindo e o bolso do uniforme fica inchado
Hí! Hí! Um cafezinho aqui!
Uma cervejinha ali (tô ligado)
Rá! Eu sei que eu não presto!
Meu colega diz (cê tá exagerando…)
Ah você que é muito honesto!
Detesto lição de moral
Cê devia fazer igual e abusar da autoridade
Esse é o único poder que essa droga de sociedade
Me dá o prazer de sentir o gostinho
Não tô nem aí se você prefere bancar o policial bonzinho
Perfeito
Mas vou continuar do meu jeito
Não sou super herói
E pimenta nos olhos dos outros não dói
E assim como o rato rói a roupa do rei de Roma
Eu vou roendo grana
O poder me corrói
Tá me corrompendo e a soma vai crescendo (Manda!)
Morrer é o que num posso mas quanto aos negócios fica frio…
Enquanto houver crime no Rio eu num volto pra casa de bolso vazio
[Refrão]
Preciso do pão de cada dia e num sô filho do padeiro
Então preciso do dinheiro
[Verso 5]
E eu sou o dinheiro
Todos me amam, todos me querem, todos adoram sentir meu cheiro
Mas eu não sou democrático
Eu sou ingrato
Quem mais produz riqueza é quem tem menos na mesa
Que chato
Pra quem me controla a carne sobra no prato
Enquanto outros não me conhecem e comem rato
É fato real
Rato sem sal
Saiu no jornal
Eu sou imundo
Que tal?
Eu sou o grande culpado nesse mundo tão desigual
E gero o preconceito social:
Quem me tem vive bem quem num tem passa mal (será?)
Loto
Jogo do bicho
Cês sonham comigo o tempo inteiro
O capitalismo é que nem Silvio Santos (Oi! Tudo por dinheiro!)
É que vocês pensam pequeno
Vocês são um bicho muito ingênuo
O que parece ser o antídoto pode ser o próprio veneno
E o que parece essencial talvez seja supérfulo
E o que cês sonham encontrar lá longe tão perto!
A felicidade é uma muleta e vocês são todos mancos
Ela não cabe numa maleta
Não cabe no cofre
Não cabe em bancos
Qualquer que seja a profissão que você exerça
Não deixe que a sua (fixação) por Tio Patinhas lhe suba a cabeça
Vocês humanos estão cegos
Me supervalorizam demais
Cada vez mais
A cada segundo que passa
Deixam seu mundo em constante ameaça
Me pondo acima de Deus e o diabo
Desse jeito eu acabo com a sua raça